sexta-feira, março 24, 2023

 

Quiroga - 5421


 VERGONHA E SEM-VERGONHA

Inúmeras pessoas representativas das ideias que tu abominas merecem teu desprezo, e te regozija a ideia de elas experimentarem a vergonha pública, de serem linchadas por uma voragem de comentários violentos, de um tipo que ninguém teria coragem de expressar em presença.

Tudo isso, porém, tem uma pegadinha, uma armadilha que a gente não percebe enquanto se regozija na desgraça alheia (e não adianta afirmar teoricamente que a desgraça alheia não nos regozija, rimos muito, por exemplo, dos vídeos de gente se esborrachando no chão).

A pegadinha é a seguinte, o prazer de ver alguém passar vergonha só é legítimo em quem não tiver essa vulnerabilidade, ou seja, um sem-vergonha, porque se a vulnerabilidade da vergonha existir em quem, circunstancialmente, se regozija com a vergonha alheia, é inevitável que com o passar do tempo esse prazer de ver alguém se dando mal seja substituído pela vergonha que se sente quando as coisas dão errado, vergonha que se multiplica porque sabemos que haverá uma plateia sentindo prazer com nossa desgraça.

A sem-vergonhice parece dominar, e se formos levar a sério a teoria de Darwin, o futuro será conquistado pelos sem-vergonhas, os imunes à moralidade.

É tentador converter-se em sem-vergonha, mas, ou se tem vocação para isso, ou não se tem, não há como aprender a sermos sem-vergonhas.

Além disso, sinto informar, Darwin entendeu muita coisa dos animais, mas dos humanos entendeu pouco, porque nosso futuro não segue uma sequência lógica de evolução conectada ao meio ambiente.

Nossa evolução é pautada por algo que está além disso, e que mesmo não consigamos definir o que isso seja, ainda assim é mais sábio aprendermos a nos amar e respeitar mutuamente.

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