terça-feira, abril 24, 2007

 

Chuang Tzu: O Valor do que é Inútil


A vida é dialética, e porisso não é lógica. A lógica significa que o oposto é realmente oposto, e a vida sempre implica o oposto em si mesmo. Na vida, o oposto não é realmente oposto, mas complementar. Sem ele, nada é possível. Por exemplo, a vida existe por causa da morte. Se não houvesse morte, não poderia haver vida. A morte não é o fim e não é inimiga; pelo contrário, por causa da morte, a vida se torna possível. Assim, a morte não está em algum lugar no final; ela está presente aqui e agora. Cada momento tem sua vida e sua morte; senão, a vida seria impossível.

Hui Tzu disse a Chuang Tzu: "Todo o seu ensinamento está centrado no que não tem utilidade".

Chuang Tzu replicou: "Se você não apreciar o que não tem utilidade, não poderá começar a falar sobre o que pode ser usado. Por exemplo, a terra é ampla e vasta, mas, apesar de toda sua extensão, uma pessoa só usa alguns centímetros por vez, sobre os quais fica.

"Agora, suponha que de repente você tire tudo o que essa pessoa não esteja usando nesse momento, de tal modo que, por toda a volta de seus pés, abra-se um enorme abismo e ela fique rodeada pelo vazio, sem nada sólido em lugar nenhum, exceto sob cada um de seus pés. Por quanto tempo ela será capaz de usar o que está usando?"

Hui Tzu respondeu: "Esse espaço deixaria de servir a qualquer propósito".

Chuang Tzu concluiu: "Isso mostra a absoluta necessidade do que supostamente não tem nenhuma utilidade".

Existe a luz, existe a escuridão. Para a lógica, elas são opostas, e a lógica dirá: se houver luz, não poderá haver escuridão; se houver o escuro, não poderá haver luz. Mas a vida diz justamente o contrário; ela diz: se existe escuridão, é porque existe luz; se existe luz, é porque existe escuridão.

Existe silêncio por causa do som; se não houvesse som, você poderia ser silencioso? O oposto é necessário como um pano de fundo. Os que seguem a lógica sempre erram o caminho, porque suas vidas ficam desequilibradas. Eles pensam na luz, e então começam a negar a escuridão; eles pensam na vida, então começam a lutar contra a morte.

Há uma tradição que diz que Deus é luz, e há uma outra que diz que Deus é escuridão. Ambas estão erradas, porque ambas são lógicas, elas negam o oposto. E a vida é tão imensa que ela carrega o oposto em si. O oposto não é negado, mas incluído.

Apenas mentes pequenas são coerentes e, quanto mais estreita for a mente, mais coerente ela é... Quando a mente é vasta, tudo está presente: a luz existe, a escuridão existe, Deus existe e o demônio também existe em toda a sua glória.

Se você entender esse misterioso processo da vida, que avança por meio dos opostos, que é dialético - os opostos ajudam, dão equilíbrio, dão o tom, servem como pano de fundo -, só então você poderá entender Chuang Tzu, porque toda a visão taoísta está baseada na complementariedade dos opostos.

Eles usam duas palavras, yin e yang, que são opostas: masculino e feminino. Pense em um mundo que seja totalmente masculino ou em um mundo que seja totalmente feminino; ele estaria morto.

O oposto é necessário porque o oposto atrai, torna-se um íma, puxa (movimenta) você; o oposto leva você para fora de si mesmo, quebra a sua prisão, deixa você grande. Sempre que o oposto for negado, haverá dificuldade, e é isso que temos feito (negar o feminino); daí haver tantos problemas no mundo.

O ser humano atual tentou criar uma sociedade basicamente masculina, e é porisso que há tantos problemas; a mulher foi negada, foi expulsa. Nos séculos passados, a mulher nunca era vista em lugar nenhum; ela era escondida em aposentos, no fundo da casa, sem nem sequer ter permissão para ficar na sala de estar. Ela não era vista nas ruas, nas lojas... Ela não fazia parte da vida, e o mundo ficou feio, pois como se pode negar o oposto? O mundo ficou desequilibrado, todo o equilíbrio foi perdido; o mundo enloqueceu.

Em muitas culturas, a mulher ainda não tem permissão para participar totalmente da vida; ela ainda não é realmente uma parte, uma parte vital da vida. Os homens participam de grupos voltados para os homens, como clubes exclusivamente masculinos: o mundo dos negócios, a política, grupos científicos... e em todos esses agrupamentos há desequilíbrio. O homem domina, e é porisso que há tanta infelicidade. E, quando um dos pólos opostos domina, há infelicidade porque o outro fica magoado e se vinga. Assim, toda mulher se vinga em casa.

Ao negar o oposto, você cria problemas; e o mesmo acontece em todos os caminhos, em todos os níveis, em todas as dimensões.

Chuang Tzu diz que, se você negar o inútil, então não haverá utilidade no mundo. Se você negar o inútil, a brincadeira, a diversão, não poderá haver nenhum trabalho, nenhuma obrigação. Isso é muito difícil de entender, pois toda a nossa ênfase recai sobre o que é útil.

Se alguém perguntar do que é feita uma casa, você dirá que ela é feita de paredes. E Chuang Tzu diria, assim como seu mestre Lao Tzu, que uma casa não é feita de paredes, mas de portas e janelas. A ênfase deles está na outra parte; eles dizem que as paredes são úteis, mas que o seu uso depende do espaço inútil que fica atrás das paredes. Um cômodo é espaço e não paredes. É claro, o espaço é de graça e as paredes precisam ser compradas. Quando você compra uma casa, o que você compra? As paredes, o material, o visível. Mas você pode viver dentro do material? Você pode viver dentro das paredes? Você terá de viver no quarto, no espaço vazio. Você compra um barco, mas precisa navegar no vazio.

Assim, o que é realmente uma casa? Ela é um vazio cercado por paredes. E o que é uma porta? Não é nada; "porta" significa que não existe nada, nenhuma parede, apenas vazio. Mas você não pode entrar na casa se não houver portas; se não houver nenhuma janela, o sol não entrará, nenhuma brisa soprará. Você estará morto e a sua casa se tornará um túmulo.

Chuang Tzu diz para nos lembrarmos de que a casa é feita de duas coisas: as paredes, o material, o vendável, o que é útil, e o vazio cercado pelas paredes, o que não é útil, o que não pode ser comprado, não pode ser vendido, o que não tem valor econômico. Como você pode vender o vazio? Mas você precisa viver no vazio; se uma pessoa tentar viver apenas nas paredes, ela enlouquecerá, pois isso é impossível. Mas tentamos sempre fazer o impossível; na vida, escolhemos apenas o que é útil.

Você é realmente você mesmo quando está fazendo algo inútil - fazendo uma pintura não para vender, mas apenas para se divertir; cuidando do jardim apenas para se divertir; deitado na praia sem fazer nada, apenas para se divertir; sentado no silêncio ao lado de um amigo, sem fazer nada, apenas por gostar de estar ali.

Muito poderia ser feito nesses momentos, você poderia ir ao shopping, poderia ganhar dinheiro, poderia trocar tempo por dinheiro, poderia aumentar sua conta bancária, pois esses momentos não voltarão e os tolos dizem que tempo é dinheiro. Eles conhecem apenas uma utilidade para o tempo: convertê-lo em mais e mais dinheiro. No final, você morre com uma grande conta bancária, mas por dentro está totalmente pobre, pois a riqueza interior só aparece quando você pode desfrutar o inútil.

O que é meditação? As pessoas perguntam: "Qual é a utilidade da meditação? O que ganhamos com ela? Qual é o seu benefício?" Meditação... e você pergunta sobre seu benefício (utilidade)? Você não pode entendê-la porque a meditação é simplesmente inútil. No momento em que digo "inútil", você se sente pouco à vontade, pois a mente toda se tornou tão utiliária, tão voltada para a comodidade que você sempre espera um resultado. Você não pode acreditar que algo possa ser apenas um prazer em si mesmo.

Inútil significa que você faz a coisa por prazer, sem pensar nos benefícios que ela traz.

Existem dois tipos de pessoas no mundo: os utilitaristas, que se tornam cientistas, engenheiros, médicos; e um outro ramo, o tipo complementar, dos poetas, dos vagabundos - os inúteis, que nada fazem de útil. Mas ambos propiciam o equilíbrio, dão graça ao mundo. Pense em um mundo cheio de cientistas e sem nenhum poeta; ele seria absolutamente feio e não valeria a pena viver nele. Pense em um mundo com todos nas lojas, nos escritórios, nas fábricas, sem nenhum vagabundo; seria o inferno. O vagabundo confere beleza ao mundo.

Dois vagabundos foram presos e o juiz perguntou ao primeiro: "Onde você mora?". O homem respondeu: "O mundo inteiro é o meu lar, o céu é o meu abrigo; vou a todos os lugares e não existem barreiras para mim. Sou uma pessoa livre". E o juiz perguntou ao outro: "E você, onde mora?". O segundo vagabundo disse: "Sou vizinho dele".

Essas pessoas dão beleza ao mundo, trazem uma fragrância. Um Buda é um grande vagabundo, um Mahavira é um vagabundo.

Quando o mundo se torna utilitário demais, você cria muitas coisas, possui muitas coisas, torna-se obcecado por coisas, mas o seu interior se perde, pois o interior só pode florescer quando não existem tensões externas, quando você não está indo a lugar nenhum e está apenas descansando. Então o interior floresce; o mais elevado sempre acontece quando você não está fazendo nada, só o trivial acontece quando você está fazendo alguma coisa.

O filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard disse: "Quando comecei a rezar, ia à igreja e falava com Deus. Então, de repente, percebi que falar era inútil. Como posso falar com Deus? A pessoa precisa ficar em silêncio, pois o que eu vou dizer? E o que eu posso dizer que ajudará Deus a saber mais? Ele é onipotente, onipresente e onisciente, então qual é o propósito de contar para ele? Conversei com ele durante anos, então, de repente, percebi que isso era tolice. Então parei de falar e fiquei em silêncio, e depois de muitos anos percebi que até mesmo o silêncio não tinha sentido. Então dei o terceiro passo: passei a ouvir. Primeiro eu falava, depois parei de falar e depois comecei a ouvir".

Ouvir é diferente de apenas ficar em silêncio, pois só ficar silencioso é algo negativo; ouvir é algo positivo. Apenas ficar em silêncio é algo passivo e o ouvir é uma passividade alerta, que espera algo sem nada dizer, mas espera com todo o ser. Ele tem uma intensidade, e Kierkegaard disse: "Quando esse ouvir aconteceu, então pela primeira vez a prece aconteceu".

Mas parece que ouvir é absolutamente inútil, especialmente ouvir o desconhecido; você não sabe onde ele está. O silêncio é inútil, falar parece útil; algo pode ser feito quando se fala, pois falando você faz muitas coisas no mundo. Assim, você acha que, se quiser ser religioso, também terá de fazer alguma coisa.

Mas Chuang Tzu disse: A religião só começa quando você entender a futilidade de todo o fazer e quando tiver mudado para o pólo oposto, o do não fazer, da inatividade, do ficar passivo e tornar-se inútil (para a sociedade).

Chuang Tzu e seu mestre Lao Tzu sempre falavam do inútil e até mesmo louvavam as pessoas inúteis. Chuang Tzu falou sobre um homem, um corcunda. Todos os jovens da cidade foram forçados a entrar no exército porque eram úteis. Apenas um homem, o corcunda, foi deixado para trás por ser inútil. Chuang Tzu disse: Sejam como o corcunda, tão inúteis que não serão massacrados na guerra.

Esses mestres louvam o inútil porque dizem que o útil sempre estará em dificuldades. O mundo usará você, todos estão dispostos a usá-lo, a manipulá-lo, a controlá-l. Se você for inútil, ninguém olhará para você, as pessoas se esquecerão de você, elas o deixarão quieto e em paz, não se importarão com você, não ficarão cientes de que você existe (para aceitar isso, seu ego tem que cair para zero).

Chuang Tzu dizia: Esteja alerta e não seja muito útil, senão as pessoas vão explorar você. Então elas começarão a manipulá-lo e você ficará em dificuldades. E, se você puder produzir coisas, elas o forçarão a produzir por toda a sua vida. Se você puder fazer uma certa coisa, se você for habilidoso, então não poderá ser desperdiçado.

Ele diz que a inutilidade tem a sua própria utilidade intrínseca. Se você puder ser útil para os outros, então terá de viver para os outros. Inútil, ninguém olha para você, ninguém lhe presta atenção, ninguém se importa com o seu ser e você é deixado em paz. Você pode viver no mercado como se estivesse vivendo sozinho no Himalais, e nessa solitude você cresce e toda a sua energia pode se voltar para dentro de você.

Chuang Tzu diz: "Se você não apreciar o que não tem utilidade, não poderá começar a falar sobre o que pode ser usado". O inútil é o outro aspecto do útil. Você só pode falar sobre o útil por causa do inútil; essa é uma parte vital; e se você a abandonar completamente, então nada será útil. As coisas são úteis porque existem coisas inúteis.

A pessoa precisa ir ao pólo oposto, e só então ela rejuvenesce. Durante todo o dia você está acordado e, à noite, adormece. Qual é a utilidade do sono? O sono é uma perda de tempo, e não é pouco tempo. Se você viver até os noventa anos de idade, trinta anos da sua vida terão se passado dormindo, oito horas todos os dias, um terço de cada dia. Qual é a utilidade disso? Mas ao final de todo o dia de trabalho, quando você adormece, você sai do útil e entra no inútil, e é porisso qeu, pela manhã, você se sente tão rejuvenescido, tão vivo, tão aliviado; suas pernas podem dançar, sua mente pode cantar, seu coração pode de novo sentir. Toda a poeira do trabalho foi jogada fora e o espelho está novamente limpo; pela manhã você tem clareza. Como isso acontece? Isso acontece por meio do inútil.

É porisso que a meditação pode lhe dar os maiores vislumbres, porque ela é a coisa mais inútil do mundo. Você não faz coisa nenhuma e simplesmente penetra no silêncio. Ela é mais grandiosa do que o sono, pois no sono você está inconsciente, e tudo o que acontece, acontece inconscientemente. Você pode estar no paraíso, mas não o reconhece. Na meditação você se move conscientemente, e então fica ciente do caminho: como ir do mundo útil do exterior para o mundo inútil do interior. E uma vez conhecido o caminho, a qualquer momento você poderá simplesmente ir para dentro. Sentado num ônibus, você não precisa fazer nada e está simplesmente sentado; viajando de carro, de trem ou de avião, você não está fazendo nada, pois tudo está sendo feito pelos outros; você pode fechar os olhos e entrar no inútil, no interior. E de repente tudo fica em silêncio, tudo fica fresco e você está na fonte de toda a vida.

Mas isso não tem qualquer valor no mundo dos negócios, você não pode vender esse estado, não pode dizer: "Tenho uma grande meditação. Alguém está interessado em comprá-la?. Ninguém estará interessado em comprá-la, ela não é uma mercadoria, ela é inútil.

A parte da terra que é inútil dá suporte à útil, e o inútil é vasto, enquanto o útil é muito pequeno. Isso é verdadeiro em relação a todos os níveis do ser: o inútil é vasto, enquanto o útil é muito pequeno. Se você tentar salvar apenas o útil e se esquecer do inútil, mais cedo ou mais tarde você ficará zonzo. E isso já aconteceu; você já está zonzo, caindo no abismo.

Por todo o mundo, os pensadores têm um problema: a vida, para eles, não tem significado, parece que ela não tem sentido. Pergunte a um Sartre, Marcel, Jaspers, Heidegger; eles dizem que a vida não tem sentido. Por que a vida ficou sem sentido? Isso nunca foi assim. Buda nunca disse isso; Krishna podia dançar, cantar, gostar de si mesmo; Maomé podia orar e agradecer a Deus pela bênção da vida; Chuang Tzu era feliz, tão feliz quanto se pode ser. Essas pessoas nunca disseram que a vida não tinha sentido. O que aconteceu com a mente moderna? Por que a vida parece tão sem sentido?

A terra inteira foi eliminada e você foi deixado somente sobre a parte na qual você está sentado ou em pé. Você está ficando atordoado, por toda sua volta só vê abismo e perigo. Você não pode usar a terra sobre a qual está agora porque só pode usá-la quando o inútil se junta a ela. O inútil precisa estar presente.

O que isso quer dizer? Sua vida se tornou apenas trabalho e nenhuma diversão. A diversão é o inútil, o vasto; o trabalho é o útil, o trivial, o pequeno. Você encheu completamente a sua vida com trabalho. Sempre que você começa a fazer alguma coisa, a primeira pergunta que lhe vem à mente é qual a utilidade daquilo. Se tiver utilidade, você faz.

Numa história, Sartre diz: "O amor é só para os pobres. Meus empregados podem amar por mim". É claro; por que um Henry Ford desperdiçaria seu tempo fazendo amor com uma mulher? Um empregado mal remunerado poderia fazer isso, pois o tempo de Ford é muito mais valioso, e ele poderia usá-lo em algo mais útil.

Observando a mente humana, é possível que no futuro só os empregados façam amor. Quando se pode enviar um empregado, por que se preocupar? Quando tudo é considerado em termos econômicos, quando um Ford ou um Rockefeller pode fazer muito melhor uso do seu tempo, por que deveriam desperdiçá-lo com suas esposas? Para isso eles podem mandar um empregado, e isso será menos problemático.

Parece um absurdo, mas isso já aconteceu em muitas dimensões da vida. Você nunca brinca, seus empregados é que brincam; você nunca é um participante ativo em nenhuma diversão, e os outros fazem isso para você. Você assiste a um jogo de futebol, e nele outras pessoas estão jogando e você está apenas assistindo. Você é um espectador passivo, que não se envolve. Você vai ao cinema e vê os outros fazendo amor, fazendo guerra, violência e tudo o mais; você é apenas um espectador na sua poltrona. Isso é tão inútil que não precisa se preocupar em fazer tudo isso; qualquer outra pessoa pode fazê-lo e você pode apenas observar. Trabalho você faz, mas diversão os outros a fazem por você.

A vida parece não ter sentido porque o sentido surge no equilíbrio entre o útil e o inútil. Você negou completamente o inútil, fechou a porta, e agora só o útil está presente e isso o faz sentir-se sobrecarregado. É um sinal de sucesso ter úlcera aos quarenta anos de idade. Se você tem cinqüenta anos e a úlcera ainda não apareceu, você deve ser um fracassado. O que você tem feito na vida? Você deve ter desperdiçado tempo. Aos cinqüenta, a pessoa deveria ter tido seu primeiro ataque cardíaco e, aos sessenta, a pessoa realmente bem-sucedida morre, sem nunca ter vivido. Não havia tempo para viver, pois ela tinha coisas muito mais importantes para fazer.

Olhe à sua volta, observe as pessoas de sucesso, sejam elas polítcos, professores, pessoas abastadas ou grandes empresários. O que está acontecendo com elas? Não olhe para as coisas que essas pessoas possuem, mas diretamente para elas, pois, se você olhar para as coisas, será enganado. As coisas não têm úlcera, os carrões não tem têm ataque do coração, as casas não são hospitalizadas. Não olhe para as coisas, senão você se iludirá. Olhe para a pessoa destituída de todas as suas posses, olhe diretamente para ela, e então você sentirá a sua pobreza (principalmente de saúde); até um mendigo pode ser uma pessoa rica, até um pobretão pode ser mais rico no que se refere à vida.

O sucesso é um fracasso, e nada é um fracasso maior do que o sucesso, pois a pessoa bem-sucedida perde o domínio sobre a vida e sobre tudo. A pessoa bem-sucedida está na verdade barganhando, jogando fora o real em troca do irreal, jogando fora diamantes interiores em troca de pedrinhas coloridas da praia, juntando pedras e perdendo diamantes. Mas como você olha com os olhos da ambição, você olha para as posses; você nunca olha para o político, mas para o seu cargo, para o poder. Você nunca olha para a pessoa que está sentada ali absolutamente impotente, perdendo tudo sem nem ter um vislumbre do que é o estado de plenitude. Ela comprou o poder, mas, ao comprá-lo, perdeu a si mesma; o ser interior está se perdendo por causa de posses fúteis. Você pode enganar os outros, mas como você será capaz de enganar a si mesmo? No final, você olhará para a sua vida e perceberá que a perdeu por causa do útil.

O inútil precisa estar presente. O útil é como um jardim arrumado e limpo; o inútil é como uma grande floresta intocada, e ela não pode ser arrumada e limpa. A natureza tem a sua própria beleza e, quando tudo fica arrumado e limpo, ela já está morta. O jardim é algo falso; a coisa verdadeira é a floresta. O inútil é como uma grande floresta; o útil é como um belo jardim que você criou à volta da sua casa.

Chuang Tzu enfatizou muito o inútil porque você enfatizou muito o útil. Fora isso, essa ênfase não é necessária, pois serve apenas para lhe dar equilíbrio. Você foi demasiadamente para a esquerda e precisa ser puxado para a direita. Mas lembre-se, por causa dessa grande ênfase, você pode novamente ir para o outro extremo, e isso aconteceu a muitos seguidores de Chuang Tzu. Eles ficaram viciados no inútil, e não era esse o ponto; eles não compreenderam. Cuidado, pois a mente pode ir para o oposto e permenecer a mesma, enquanto a coisa real é a transcendência. Você precisa chegar ao ponto em que possa usar o útil e o inútil, em que possa usar o que tem propósito e o que não tem propósito. Então você está além de ambos, e ambos o servem.

Pessoas como Chuang Tzu são perigosas porque podem ser mal-interpretadas, e há mais possibilidade de haver mal-entendidos do que de haver entendimento correto. A mente diz: "Tudo bem, chega de trabalhar nesta firma, chega de família; serei agora um vagabundo". Isso é entender mal, pois você carregará a mesma mente e ficará viciado em ser um vagabundo. Então você não será capaz de voltar à firma, ao mercado, à família, e ficará com medo disso.

Da mesma maneira, se você se vicia com um remédio, ele poderá se tornar uma nova doença. Primeiro você precisa se livrar da doença, e imediatamente depois você precisa se livrar do remédio, senão ele tomará o lugar da doença e você ficará apegado a ela para sempre.

Lembre-se: o inútil tem a sua própria atração. Se você estiver muito perturbado pelo útil, poderá ir para o outro extremo e perder o equilíbrio.

Um profundo equilíbrio é necessário; deve-se ficar no meio, livre de todos os opostos. Você pode usar o útil e pode usar o inútil; pode usar o que tem propósito e o que não tem propósito e, ainda assim, ficar além dos dois. Você não é usado por eles e se tornou um mestre.

[continua]

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